A importância da saúde intestinal na produção de ovos em sistemas alternativos
Harriet Walker
Gut Health Technical Co-ordinator, Alltech
A transição da produção de ovos para os sistemas alternativos é uma tendência crescente. A Comissão Europeia estima que mais de 50% dos ovos da União Europeia (UE) sejam já produzidos nesses sistemas. Para os produtores que ainda não iniciaram essa transição, é chegado o momento de refletir sobre os novos desafios e também sobre os velhos desafios que poderão ser acentuados nos sistemas alternativos.
O alojamento fora de gaiola aumenta não só a mobilidade das aves, mas também o contacto com a cama e as fezes, com o ambiente exterior e com um maior número de outras aves. Daqui resulta o possível surgimento de vários problemas, nomeadamente ao nível da saúde intestinal, da necessidade de utilização de antibióticos, do aumento do consumo de ração, dos desafios para o controlo de várias doenças e da existência de camas húmidas.
Uso de antibióticos
O alojamento das aves em sistemas alternativos aumenta a sua exposição a microrganismos potencialmente causadores de doenças, o que contribui para elevar a taxa de mortalidade média dos bandos relativamente à verificada em gaiolas. Este aumento da taxa de mortalidade tem um impacto negativo sobre a saúde e o bem-estar das aves, a produtividade e a sustentabilidade da avicultura de postura.
O desejo de melhorar o desempenho e reduzir a taxa de mortalidade do bando pode aliciar um produtor para a utilização de antibióticos. No entanto, o seu uso de forma inadequada está associado ao surgimento de resistência aos antibióticos, que está na base de graves problemas de saúde humana e animal. Por conseguinte, com o aumento do número de aves alojadas em sistemas alternativos, que aumentam o risco de transmissão de microrganismos, aumenta igualmente a necessidade de melhorar o desempenho dos bandos sem recorrer a antibióticos de maneira indiscriminada. Uma forma adequada para atingir esse objetivo consiste na melhoria da saúde intestinal e da microflora do intestino, através da utilização de um programa “Seed, Feed, Weed”. Este programa consiste em “semear” o intestino com microrganismos benéficos, “alimentar” um ambiente favorável a esses organismos e eliminar os microrganismos que podem causar doenças (patogénicos).
Desenvolvimento da microflora
Para estimular o desenvolvimento do intestino e da microflora das aves jovens, estas devem ser expostas a microrganismos benéficos o mais cedo possível. Isto pode ser feito através de um probiótico, que ajuda a ave a desenvolver uma microflora diversificada e equilibrada, assim promovendo a saúde intestinal e, desta forma, melhorando a digestibilidade e a absorção de nutrientes, a imunidade e o desempenho.
Uma microflora equilibrada não só melhora a altura das vilosidades e aumenta a superfície de absorção do intestino, como também pode melhorar a capacidade da ave para se defender das bactérias patogénicas.
Uma vez estabelecida essa microflora benéfica, é fundamental que seja mantida. Isto pode ser um desafio em sistemas de produção sem gaiolas, uma vez que as aves têm maior probabilidade de contacto com bactérias patogénicas que colonizam o intestino, o que aumenta o risco de enterite e conduz à redução da produtividade do bando, bem como a vários problemas de saúde e bem-estar. Para ajudar a ave a manter uma microflora equilibrada, pode ser incorporado na ração um ácido orgânico fraco tamponado, que contribui para a redução do pH no intestino.
Um baixo valor de pH do intestino combate a proliferação de organismos patogénicos, como Clostridium perfringens e Campylobacter, que são intolerantes a condições ácidas. Além disso, a utilização de um ácido orgânico fraco tamponado favorece a colonização do intestino pela microflora benéfica.
Suplementação da ração
Dada a maior exposição das aves a organismos potencialmente causadores de doença, é recomendável utilizar um aditivo que reduza a colonização do intestino por bactérias patogénicas. O Actigen® é um produto bioativo único, de segunda geração, obtido a partir de uma estirpe da levedura Saccharomyces cerevisiae, que foi selecionada e isolada pela Alltech de forma a criar um produto com a máxima eficácia na otimização da saúde intestinal. Para que um agente patogénico possa causar doença, deve primeiro aderir ao epitélio intestinal, através de projeções conhecidas por fímbrias de tipo 1. Após essa adesão, o agente patogénico pode replicar-se, o que pode causar inflamação, danos nas vilosidades e redução da absorção de nutrientes.
Ao ligar-se às fímbrias de tipo 1, o Actigen® pode inibir a adesão das bactérias patogénicas, sendo preferível ao uso de antibióticos, pois estes não são específicos e destroem tanto os agentes patogénicos como os microrganismos benéficos. Foi já demonstrado que o Actigen® melhora a capacidade de absorção, ao aumentar a altura e a superfície das vilosidades e ao melhorar a proporção vilosidade:cripta, o que permite uma melhor absorção dos nutrientes e, portanto, um melhor desempenho. Também ajuda a manter a diversidade microbiana, a promover uma boa saúde intestinal e a reforçar as defesas naturais do animal.
Consumo de ração
O alojamento num sistema sem gaiolas, por exemplo numa exploração ao ar livre, permite que as galinhas exibam vários comportamentos naturais que são limitados nas gaiolas: correr, voar, banhos de poeira, limpeza do bico, cuidar das penas e esticar os membros. Este acréscimo da mobilidade é acompanhado pelo aumento do gasto de energia pela galinha, que pode ser ainda maior em caso de condições climáticas adversas.
A ave precisa de aumentar o consumo de ração para satisfazer este aumento do gasto de energia. Caso contrário, a ave terá de obtê-la de outra forma, nomeadamente através de alguma energia que deveria ser utilizada para a produção de ovos. Isto significa que é vital que a ave tenha uma saúde intestinal ótima, que maximize a superfície do intestino, para assim melhorar a absorção dos nutrientes e permitir uma conversão alimentar mais eficiente. A ativação do sistema imunitário requer energia e nutrientes, que deveriam ser utilizados para a produção de ovos. Com o aumento da probabilidade de exposição a bactérias patogénicas, a ave deve ter uma saúde intestinal e uma microflora ótimas, uma vez que estas desempenham um papel fundamental na modulação do sistema imunitário, através da prevenção de infeções da mucosa intestinal.
Humidade da cama
Em sistemas sem gaiolas, as galinhas têm maior contacto com a cama; por isso, a sua humidade torna-se um fator de preocupação. A cama húmida e o elevado teor de amoníaco podem provocar dermatite da almofada plantar, que pode progredir para uma infeção dolorosa. Embora raras em gaiolas melhoradas, a frequência dessas infeções pode ser muito superior em sistemas alternativos.
Existem muitos fatores que podem contribuir para a humidade da cama, incluindo problemas digestivos, desequilíbrio nutricional, diversas doenças, derrame dos bebedouros, ventilação inadequada e clima húmido. Tanto os agentes não patogénicos como os agentes patogénicos podem causar diarreia e provocar excesso de humidade na cama. Por isso, é vital que a causa subjacente seja identificada e que sejam implementadas medidas corretivas o mais rapidamente possível, para permitir que a ave recupere a saúde intestinal ótima.
As micotoxinas, a coccidiose e a disbacteriose podem reduzir a integridade intestinal e danificar o epitélio intestinal, levando à diminuição da absorção e da digestão dos nutrientes e ao aumento da permeabilidade da barreira intestinal, o que contribui para a existência de camas húmidas. Quando a estrutura do intestino está danificada, os nutrientes não digeridos podem chegar até ao ceco, fornecendo uma fonte de nutrientes à população microbiana que aí reside. Muitas vezes, organismos potencialmente patogénicos são encontrados no ceco, e esta fonte de nutrientes permite-lhes replicarem-se até níveis que causam desequilíbrios na microflora, e que depois afetam o desempenho da ave e o estado da cama.
Controlo de doenças
A coccidiose é uma doença intestinal causada por protozoários do género Eimeria, que danificam o epitélio do intestino. Esse dano permite a proliferação de bactérias patogénicas. Os sintomas da coccidiose são diarreia sanguinolenta, desidratação, letargia, elevada mortalidade, fraco crescimento/ganho de peso e redução da produção de ovos. A coccidiose pode ser controlada através de ionóforos e compostos químicos adicionados à ração, que inibem o desenvolvimento dos oocistos. No entanto, a utilização dos anticoccidianos pode causar o surgimento de resistência e tolerância a essas substâncias, pelo que devem ser usados em ciclos, de forma a preservar a sua eficácia.
Outra forma de controlar a coccidiose é através da vacinação, que permite o desenvolvimento de imunidade contra a doença. Nos sistemas alternativos, a existência de cama aumenta o contacto das aves com as coccídeas. Porém, as poedeiras alojadas nesses sistemas são habitualmente vacinadas contra a coccidiose, por isso desenvolvem imunidade ainda durante a recria.
Parasitas intestinais
Os parasitas intestinais podem ser um problema quando as aves têm contacto com a vegetação, o solo e as fezes. Portanto, a exposição a parasitas intestinais é provável num aviário ou num sistema de ar livre. Os parasitas danificam o intestino da ave, resultando num desempenho reduzido.
Os parasitas intestinais podem transportar outros parasitas, por exemplo Histomonas, que causa a histomonose (também conhecida por “cabeça negra”). A histomonose é uma doença das aves causada por um protozoário, que pode ser transmitido através de outro parasita (Heterakis gallinarum, um nemátode). As aves ficam infetadas quando ingerem alimentos, invertebrados (como minhocas) ou excrementos contaminados com Histomonas. A transmissão direta, ou seja, de uma ave para outra ave, também pode ocorrer dentro do bando.
As aves afetadas pela histomonose apresentam-se geralmente apáticas, com as asas caídas, as penas “desleixadas”, fezes amarelas e redução da produção de ovos. É essencial que as aves infetadas com Histomonas sejam desparasitadas, para matar esses parasitas.
É crucial também que as aves sejam monitorizadas para detetar parasitas, e que sejam desparasitadas eficazmente antes da transferência para as instalações de postura, para restringir a presença de parasitas nos parques exteriores.
Este artigo foi publicado originalmente na revista Poultry World.